quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Discofonia (23/24/25 Fevereiro)

Richard Hawley-Serious

Marco Barroso-
L.U.M.E. Big Band

"Eu chego com tudo escrito. Até por questões práticas, geralmente o tempo para ensaiar não é muito e as coisas têm que funcionar depressa, tens que ver o que não está bem depressa, tens que ir para casa pensar depressa e pôr as coisas a... bombar rapidamente. Portanto, isso tudo passa muito por mim, realmente. Perceber o que é que funciona, o que este músico faz bem, onde é que ele está mais confortável, aqui, acoli... E depois fazeres uma síntese disso tudo e tentares compor sinergicamente todos aqueles elementos, não é?"

"Quando estás a falar de um contexto de orquestra, eu acho que tens que imprimir directrizes... acho que o contexto pode ser muito improvisado e tu vês orquestras de free jazz e com uma estética muito vanguardista, que fazem uma música muito interessante, mas às vezes sente-se um bocado falta dessa directriz. Eu compreendo a ideia de querer uma música que seja muito momentânea, muito improvisada, muito democrática, não é?, mas tu podes enriquecer o discurso com nuances dando directrizes e não comprometendo esse sentimento de momento. (...) Ali, a ideia é realmente haver um equilíbrio entre as minhas ideias, entre a minha música e aquilo que eu faço em termos da composição, e depois aquilo que eles podem dar, enquanto intérpretes e enquanto improvisadores, e é chegar a uma sinergia dentro desse equilíbrio. Porque atrai-me muito essa ideia de uma música que seja composta mas que é complementada com a improvisação, porque no fundo a minha música é revitalizada pelas idiossincrasias e por todo o background que eles têm."

"Eu falo nessas influências todas, do Mike Patton, dos Megadeth, da Italian Instabile Orchestra, da Vienna Art Orchestra, isto, aquilo, aqueloutro, mas no fundo... quer dizer, claro que nós temos sempre uma tendência para analisar e desmistificar o que estamos a fazer mas eu até gosto de conservar alguma ingenuidade. Isto pode parecer um bocado estranho... eu acho que deve haver alguma irracionalidade quando estamos a fazer as coisas, sob pena de se poder estar sempre a castrar.(...) Acho que tem tudo a ver com comunicação e emoções. Quer dizer, quando estás a compor... eu estou sozinho em casa, estou a escrever música e, de alguma forma, começo a emocionar-me com aquilo que estou a fazer. Não sei, é como se fosses um... um transmissor de ondas. Acho que quando estás sozinho, isto é um bocado esquisito, mas tu podes estar sozinho e estás a compor... eu acho que já estás a comunicar... Há ali qualquer coisa estranha que não passa só por mim, passa por essa coisa de estar a emitir ondas... É uma forma transcendental, às tantas, de estar a comunicar, não sei..."

Mari Boine-
Big Medicine

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Discofonia /16/17/18 Fevereiro)

Festival para Gente Sentada, Santa Maria da Feira, 2008.

Sean Riley & The Slowriders-
Lights Out
Norberto Lobo-
Cantiga da Ceifa
Nina Nastasia-
Late Night

Terry Lee Hale-
Hearts


Richard Hawley-Roll River Roll


Joe Henry-Loves You Madly

"Creio que o disco de colaborações soul, I Believe to My Soul, que criei... foi um projecto que desenvolvi, com o Allen Toussaint, a Mavis, a Irma Thomas, a Ann Peebles e o Billy Preston, foi para mim uma satisfação enorme, porque comecei com uma ideia e levei-a até ao fim, e foi uma viagem e tanto! Sinto-me muito orgulhoso por ter sido feito. Foi quase como realizar um filme, foi um caminho tão longo e envolveu tanta gente antes de se conseguir chegar ao fim... Mas todos os discos que fiz têm alguma vertente de que me orgulho. E tenho um orgulho especial no disco do Solomon Burke, Don't Give Up on Me, porque eu não era a escolha mais óbvia para produzir o disco, e a certa altura achei que não ia ficar com a produção... E fizémos uma coisa única, muito especial, com o Solomon- seguramente, em todo o caso, algo que ele nunca tinha feito antes. Não foi um projecto fácil mas foi bonito e tenho muito orgulho nele."

Joe Henry-Civilians
"As minhas canções não podem ser explicadas como se houvesse legendas num filme... Se houvesse uma forma mais directa, mais limpa, de dizer o que queria dizer, então teria escrito assim. Acho que, por vezes, há aspectos da vida tão obscuros e tão cheios de nuances, que têm que ser enfrentados da mesma forma. Se eu tivesse que resumir essa canção, diria que é sobre pessoas que tentam manter o equilíbrio nas suas vidas, entre as expectativas e a realidade. Que tentam enfrentar o facto de que a vida tem o seu próprio caminho e que não corresponde à forma como a imaginámos, ou sequer que conseguimos controlar esse caminho. E que todos temos que ter paz com o facto de que, a certa altura, há qualquer outra coisa que toma o controlo."

"(Trabalhar com o Ornette Coleman) foi uma experiência transformadora! Eu compreendo que a música dele seja difícil para algumas pessoas, mas podemos dizer o mesmo da música do Duke Ellington, do Erik Satie ou do Stravinsky. O Ornette não toca para soar difícil, ele apenas toca a música como a ouve. É um músico incrivelmente generoso e acho que as melodias dele são admiráveis... são muito espontâneas e podem ser complicadas para algumas pessoas mas, para mim, é alegria pura quando o ouço tocar. E tive imensa sorte que ele tivesse concordado em gravar comigo... a noite em que estivémos a trabalhar foi uma experiência de uma vida... o facto de ele ter acolhido o que eu estava a fazer e de não ter tocado nada por hábito... Ele estava realmente a tentar compreender que contribuição era necessária da sua parte, e eu fiquei-lhe grato, foi realmente espantoso. Acho que ele é um músico sem par, não há ninguém como ele. E a voz dele no saxofone é tão imediatamente reconhecível como a voz do Frank Sinatra. Ouvimo-lo tocar duas notas e sabemos que é ele, e acho que isso é um grande dom."

Joe Henry-
Richard Pryor Addresses a Tearful Nation

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Discofonia (9/10/11 Fevereiro)

The Magnetic Fields-Courtesans

Enrico Rava-
The Words and The Days

"Não sei porque é que acontece, mas ainda agora, nestes últimos anos, descobri o Stefano Bollani, o Gianluca Petrella e muitos outros, que entretanto se tornaram muito conhecidos... Na verdade começaram comigo quando eram completamente desconhecidos e jovens... Eu gosto muito de tocar com músicos novos, que querem ser bem sucedidos, especialmente se estiverem mais ou menos sintonizados com a música como eu a entendo... é muito divertido tocar com eles. Prefiro tocar com gente muito mais nova do que eu do que com músicos da minha idade. Os músicos da minha idade são como pedras, sabe? É impossível pedir-lhes para se abrirem a certas coisas, enquanto os mais novos gostam de explorar, de descobrir, são mais curiosos."

"Antes de mais, eu considero o Gianluca o melhor músico que a Itália produziu nos últimos 20 anos e um dos melhores de sempre, nascidos em Itália. Se ele tocasse clarinete ou qualquer outro instrumento, eu gostaria de tocar com ele de qualquer forma. E o mesmo é verdade do Roswell (Rudd), que é para mim um dos grandes mestres. (...) E, para além disso, eu adoro o trombone! Os meus músicos preferidos são quase sempre trompetistas, o Miles, o Chet, o Louis Armstrong, mas o prazer de tocar é maior com o trombone! Porque o trombone tem o mesmo registo da voz masculina; se eu falar e depois tocar trombone, o som é o mesmo, enquanto que o trompete é mais agudo... E embora eu fosse um amador como trombonista, era mais fácil para mim... com o trompete parece que estou sempre a lutar... Na verdade toco trompete porque gosto tanto de certos trompetistas que queria ser como eles... Mas gostava de tocar trombone. E acho que soa tão bem com o trompete, porque é o mesmo instrumento. Por exemplo, o flügelhorn não é o mesmo instrumento, o flügelhorn é um instrumento cónico, da família das tubas. Mas o trompete e o trombone pertencem à mesma família e, por isso, quando tocamos certos intervalos, por exemplo, se eu tocar uma nota, e o trombone tocar uma harmonia atrás de mim, às vezes produzimos notas extra. Tocamos só duas notas, a minha nota e a nota dele, mas se ouvirmos com atenção, conseguimos distinguir uma série de outras notas pelo meio... Surpreende-me que esta combinação de instrumentos tenha sido tão pouco usada! Excepto talvez o Bob Brookmeyer... mas não me lembro de muita gente, só eu é que juntei o trompete e o trombone como um grupo, sem qualquer outro sopro! Espanta-me que ninguém faça isso porque o som é fantástico e é tão divertido!"

"Para dizer a verdade, não costumo ouvir os meus discos antigos. Normalmente ouço muito um disco quando acabei de o gravar, e durante 2 ou 3 meses não paro de o ouvir, especialmente antes das misturas finais, para decidir pequenas coisas... Mas às vezes, quando ouço discos meus mais antigos, a única coisa que ouço são os erros... Sei que há ali um erro, num sítio qualquer, então espero que chegue o erro (risos)... Ou uma frase que acho que não toquei bem, ou de que não gosto... espero pelo momento do disco que sei que não é bom! É estranho mas nós gostaríamos de fazer o disco perfeito... Este disco, The Words and The Days, é um dos discos em que me sinto 90% feliz. Quando o ouço, penso, ok, é assim que eu gostava de... ser, de tocar, sempre! É este nível que eu gostaria de ter sempre! É um disco que me parece bem tocado, gosto dos temas, e é um disco que conta uma história. Mas também tenho alguns discos que nem sequer consigo olhar para eles! Tenho um, por exemplo, String Band, de que muitas pessoas gostaram, na altura, e eu nem posso olhar para ele! Só de olhar para a capa, sinto-me mal (risos)... Há tantas coisas nesse disco de que eu não gosto... alguns solos, coisas que o resto do grupo tocou que também não gosto... É muito difícil olharmo-nos ao espelho. Quando tocamos, é aquilo e mais nada. Abrimo-nos e pronto, somos nós. Mas nem sempre é uma visão agradável."

(9/10/11 Fevereiro)

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Discofonia (2/3/4 Fevereiro)

Cat Power-Ramblin' (Wo)man

Vasco Agostinho-
Fresco

"(A tradição) dá-nos uma base sólida daquilo que pode ser feito, além de que é um treino. Eu gosto de pensar nisto como uma linguagem verbal. Se nós queremos escrever poesia, é muito importante que conheçamos aquilo que já foi escrito (...) e isto no caso da poesia parece-me mais óbvio do que na música. E na música é fundamental porque a construção da nossa linguagem pessoal é um pouco a mistura da nossa vivência musical e a nossa vivência tem a ver com a tradição, tudo o que já foi gravado e que nós gostámos e quisémos adquirir. (...) O que nós queremos não é necessariamente ser conhecedores da tradição- quer dizer, isso dá muito jeito se quisermos dar aulas de história, mas quando se trata de tocar, o que é que nós temos que conhecer? São os recursos musicais que podem ser usados, no nosso instrumento ou na música do grupo. No fundo é isso que é importante. E naturalmente, enquanto português, por exemplo, tive uma série de influências que não vêm exclusivamente do jazz- Carlos Paredes, por exemplo, eu diria que é uma grande influência em mim."

"Desde o fado ao pop, há toda uma série de coisas que vou ouvindo, no meu dia-a-dia, que me despertam a atenção e que eu vou querer aprender porque hoje em dia, também, a música caminha para aí, não é? E caminha para aí porque nós estamos cada vez mais abertos, os músicos são cada vez mais abertos. É uma consequência natural, se calhar, da própria história da música."

"No jazz, quando nos aparece uma partitura, ela não é se não, eu diria, sei lá, 5%, quando muito 10%, daquilo que os músicos vão tocar. E isto é uma característica do jazz... é muito difícil encontrar uma partitura de um standard numa versão em que o músico tenha tocado exactamente como está escrito, ou a harmonia seja exactamente aquela, não é? E, naturalmente, quando vamos tocar um clássico, vamos tocá-lo como o ouvimos- a expressão é esta, exactamente: vamos tocar aquele tema como o ouvimos, e não há duas pessoas que o ouçam da mesma maneira. Dentro de um grupo, os 4 elementos se calhar também ouvem de formas diferentes mas juntos, portanto, todas essas formas de ouvir o tema juntas têm este resultado. (...) Se eu toco um tema do Coltrane, se calhar posso alterar o tema todo mas se calhar faço essa alteração por respeito ao próprio Coltrane."

Vijay Iyer-
Inertia